O professor Fernando Albuquerque Costa apresentou o seu modelo referencial de utilização das TIC. O cruzamento dos dois eixos ortogonais (modelo de ensino vs utilização da tecnologia) origina quatro quadrantes relativamente bem definidos, onde o perfil de cada professor se pode enquadrar.
De forma genérica, no quadrante I está o professor que utiliza as mindtools, reflete sobre a sua prática no sentido de melhoramento e aborda o currículo segundo uma visão construtivista/construcionista. No quadrante II, insere-se o professor que centra a sua prática no aluno mas desconhece as ferramentas específicas ou não as utiliza da forma mais apropriada. O professor no quadrante III é aquele que utiliza as tecnologias como mais um recurso, de acordo com o seu modelo essencialmente transmissivo e tradicional. No quadrante IV está o professor também ele tradicional mas que utiliza as ferramentas (essencialmente as mindtools) de forma desadequada a esse modelo, não retirando partido da sua utilização e potencial.
Assim, fruto de análise e reflexão, cada professor tenderá a «encaixar-se» preferencialmente num desses perfis e consequentemente num quadrante. Ressalve-se, no entanto, que é impossível mantermo-nos a cada momento de cada atividade no mesmo quadrante. Sendo o professor cujo perfil se encaixa no quadrante I o desejável, por vezes é aceitável que utilize estratégias que, naquele momento, o colocam no quadrante III. Falo nestes dois quadrantes pois são os que não revelam por parte do professor nenhum tipo de deficit. Costa (2012) apresenta dois tipos de deficit. O deficit tecnológico refere-se “às lacunas verificadas ao nível do conhecimento das tecnologias existentes e do seu domínio operacional”. Trata-se, portanto, do domínio técnico das ferramentas que, diria, tende a desvanecer-se quanto maior for a capacidade de autoaprendizagem do professor. O deficit metodológico prende-se com “as lacunas observadas ao nível do conhecimento pedagógico sobre essas tecnologias, isto é, para que servem e como utilizá-las para melhorar e tornar mais efetiva a aprendizagem dos alunos”. Facilmente se depreende que este último tem implicações mais profundas no quotidiano escolar pois exige aprendizagem da forma como integrar as tecnologias no currículo mas também uma mudança pessoal no sentido de alterar práticas (Costa 2012). Essa mudança é inevitavelmente pessoal e afetiva, implica uma predisposição e esforço pelo que é necessariamente uma mudança mais difícil de concretizar.
Muito já se discutiu dos constrangimentos à mudança, das resistências e razões para que aconteça. Por norma, existem fatores extrínsecos ao professor (uns mais justificáveis que outros) e fatores intrínsecos/afetivos que potenciam a resistência ou, pelo menos atrasam a mudança. A escola como «corpo pesado» e muitas vezes inerte, o professor com uma conceção ainda muito solitária e individualista da profissão, são aspetos que tendem a dificultar uma mudança mais rápida ou que, pelo menos, acompanhe mais de perto as mudanças da sociedade.
Voltando ao modelo referencial, existe uma linha diagonal que se dirige do quadrante III ao quadrante I, num sentido de caminho em direção a um perfil «ideal». Estes dois quadrantes não apresentam qualquer deficit mas encontram-se em polos opostos não apenas ao nível das conceções pedagógicas mas também quanto à utilização e visão que têm da tecnologia. Costa (2012) refere-se a um uso “rico” e “pobre” das tecnologias, consoante nos estejamos a referir ao quadrante I ou ao quadrante III, respetivamente. Refira-se que o professor cujo perfil se enquadra no quadrante III faz um uso muito limitado da tecnologia, sendo esta apenas mais uma ferramenta e recurso. Mas como essa utilização é coerente com o seu modelo de ensino não se pode afirmar que exista algum deficit. Esse professor, consciente ou inconscientemente, toma as suas opções tecnológicas e metodológicas em consonância, fruto de uma opção pessoal. A reflexão pessoal que cada professor tende a realizar é a de enquadrar o seu perfil de ensino e de utilização da tecnologia num dado quadrante. Como já referi, esse enquadramento é feito de forma geral pois a prática pedagógica é demasiado heterogénea para ser estanque num único quadrante. Interessante também é realizarmos o exercício de nos posicionarmos num ponto da linha e verificar se estamos num percurso ascendente e quais os constrangimentos que encontramos e nos fazem avançar ou recuar. Pessoalmente, sinto que tenho realizado (ou pelo menos tentado) esse caminho desde a minha formação inicial passando pelas minhas escolhas de formação contínua e esforço de autoaprendizagem de que o exemplo máximo talvez seja este mestrado. Sobre a formação contínua, que foi alvo de alguma discussão na reflexão que ocorreu após a webconference, muito haveria a dizer mas o aspeto que ressalta é o facto de se ter dado um ênfase desproporcional ao domínio das ferramentas em detrimento da metodologia. Isso deve-se talvez à maior facilidade em organizar e dar formação nos aspetos práticos da tecnologia do que apostar seriamente na sua utilização pedagógica. Costa (2012) refere que “mesmo depois de frequentarem os programas de formação que lhes são oferecidos, os professores e educadores continuam com fortes dúvidas sobre o que fazer, porque fazer e como fazer para, com recurso às TIC, melhorarem a aprendizagem dos alunos (Peralta & Costa, 2007)”. Embora num primeiro momento a opção pelo domínio técnico fizesse sentido, a fraca ou deficiente aposta no domínio da aplicação didática da tecnologia explica em parte o facto de ainda estarmos muito longe do desejável na escola portuguesa.
Reflexão realizada no âmbito da webconference realizada no dia 13 de dezembro 2012 pelo professor Fernando A. Costa.
Referência:
Costa, F. (2012). Desenvolvimento curricular e TIC: Do Déficit tecnológico ao deficit metodológico. In: Albano Estrela e Júlia Ferreira (Eds.). Revisitar os Estudos Curriculares – Onde estamos e para onde vamos? Lisboa: Secção Portuguesa da AFIRSE.